O QUADRO
Numa noite, ela se sentou,
se ajeitou, cruzou as pernas,
discretamente me olhou,
olhou-me de novo,
tornou a me olhar,
depois baixou a cabeça...
Fiquei sem saber e sem crer
que aquilo era verdade,
tanta frieza e tanta bondade
saindo da mesma pessoa,
tanta indecisão por um momento,
tanto ensaio, olhar de soslaio,
o jeito de mexer a cabeça...
Cruzou e descruzou as pernas,
olhou-me novamente,
olhou-me de novo, de repente,
mas não conseguia me falar.
Numa noite, ela se sentou...
Mas eu já disse isto
e não quero repetir.
Fiquei esperando mais de uma hora
até que ela saiu e foi-se embora
sem nada dizer, sem nada acontecer.
Hoje me lembro deste fato,
me lembro bem deste retrato,
me lembro desta imagem,
desta inesquecível passagem -
e aquele quadro continua,
na minha mente flutua
com fome e com sede,
preso ou pregado em alguma parede.
Cícero Alvernaz (autor)
16-03-2018.

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