OLHAR DE MENINO
Eu venho de longe, atravessei rios, passei em pinguelas, me molhei na chuva, me queimei no sol, andei de calça curta, comi angu com taioba e tomei água da bica. Venho dos trópicos, das cavernas, dos mares onde não existe mar, cansei de chorar vendo a morte de perto andando pelo deserto onde havia pouca água e nenhum oásis. Eu venho de longe, de muitas léguas distantes, de uma terra perdida no ermo onde a vida é valiosa, onde se vive de verso e prosa e também se convive com a miséria. Lá a comida é pouca, escassa, lá se divide um ovo e depois o come com farinha agradecendo a galinha que botou e matou a fome. Lá raramente chove e quando chove encharca tudo, morre gente, morre gado e tudo fica paralisado. Mas lá a vida é boa, sem violência e sem político por perto para prometer melhora e depois sumir, ir embora. Eu venho de longe, o pouco que tenho, o nada que trouxe é tudo que eu consegui guardar. Aqui me apresento, se me convidar eu me assento, se tiver comida eu como, se me der água eu bebo e se me aceitar eu fico. Mas não vou demorar por aqui, pois aqui não é o meu destino final. Ainda irei longe, atravessarei novos rios e pinguelas e celebrarei um dia a alegria de ter chegado ao meu destino com o corpo de um velho e o olhar de um menino. (31-07-2017.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

POEMA DA LAVADEIRA

ZONA RURAL