A UM VELHO. O seu andar ritmado denuncia o seu cansaço. Seu olhar profundo e distante fala de um mundo diferente no qual vives. Seu sorriso, muitas vezes imperceptível, deixa transparecer um certo contentamento interior, talvez alguma agradável lembrança que emerge de repente e coloca esse brilho no seu rosto e reflete seu amável coração. Não posso entender todo esse sentimento que flui e emana de ti. Entretanto sei e posso dizer que tudo isso me faz bem.
Vejo-te e tento me ver em ti, entender tua linguagem e teus gestos. Tento entender esse teu jeito ao mesmo tempo estranho e tão familiar. Não sei. Às vezes fico horas te olhando tentando descobrir e decifrar enigmas que surgem desta sublime contemplação. Há uma diferença, não apenas de idade e costumes – há algo contraditório que nos aproxima, e ao mesmo tempo nos afasta um do outro. Chego a imaginar nós dois andando por aí como dois jovens (ou dois velhos?) conversando animadamente, discutindo fatos do dia a dia como dois amigos que sonham em mudar o mundo. Ou, quem sabe, comentando assuntos mais amenos como, por exemplo, a chegada do ano novo e o que ele nos reserva. Nossas vidas formam momentos extremamente diferentes e opostos. Nossos sonhos têm coloridos diferentes e crescem em direções opostas. Como poderemos nos entender?
Eu queria me aproximar de ti. Colher as tuas experiências, mergulhar no teu interior e me reencontrar na tua sensibilidade. Aprender um pouco mais sobre a vida. Eu queria me perder no teu sorriso, abraçar tuas palavras... Eu queria entender esse teu jeito, me lavar em tuas lágrimas... Juntar meu jeito ao teu, minha vida à tua... Eu queria, apesar de toda contradição e diferença, me aproximar de ti, te abraçar bem forte, te beijar o rosto e te dizer: Te amo muito, te amo muito meu velho, meu Pai.

Cícero Alvernaz (autor)
Mogi Guaçu, SP, 18 de outubro de 1991.

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