UMA HISTÓRIA VERDADEIRA, ALEGRE E TRISTE
Ela vinha sempre com seu jeito simples correndo em minha direção, talvez querendo dizer alguma coisa. Ela chegava e se enroscava em mim, mas não dizia nada, simplesmente porque não sabia falar. Ficava correndo de um lado para o outro querendo chamar a minha atenção, se deitava no chão, mas eu geralmente não lhe dava nenhuma atenção. Era este o seu jeito de se comunicar e dizer que estava feliz e queria brincar. Depois ia embora, talvez decepcionada com a minha falta de tempo e de carinho. Todo dia, invariavelmente, era a mesma coisa.
Esta poderia ser uma história de amor, mas é apenas mais uma história. Uma história qualquer, simples, verdadeira, alegre e triste. De um lado, uma pessoa sempre ocupada, de outro, um animal carente tentando apenas ser gentil. Mas eu não queria essa gentileza, nem tinha tempo para brincar ou correr feito criança no quintal. Se alguém me visse assim, o que iria pensar de mim? Não, não tenho tempo para ficar de quatro brincando com gato... Só me faltava esta!
De repente ela desapareceu. Um dia, porém, ela apareceu e eu percebi que ela estava prenhe e pensei: quando ela der cria vai embora de vez e eu vou ficar sossegado. Foi o que eu pensei, mas não foi o que aconteceu. Algum tempo depois ela apareceu sozinha, magrinha e até mais feia. Não era a mesma, não tinha a mesma disposição para brincadeiras e até pensei que ela estava doente. Mas a sua aparência foi melhorando e ela voltou a ensaiar as suas brincadeiras correndo de novo pelo quintal. Tudo em vão, pois eu não queria brincar e nem tinha tempo para isto. Ela insistia se enroscando nas minhas pernas correndo o risco de ser pisada ou até morta. Que gata teimosa, chata, persistente, insuportável!
Finalmente ela sumiu de vez e eu até a esqueci. Não senti falta dela e torci para que ela não voltasse mais. Porém, para ser sincero, às vezes eu pensava nela e até sentia falta de sua chatice se enroscando nas minhas pernas. Mas era melhor assim. Finalmente desapareceu aquela gata chata que sempre dormia na garagem - que hoje está absolutamente vazia. Ela se foi e ficou no esquecimento. Para ser sincero, me senti aliviado com o seu desaparecimento. Um problema a menos, pensei.
Eu nem me lembrava mais dela quando um dia ao chegar em casa certo dia senti um cheiro muito desagradável no quintal. Deve ser algum animal morto, logo pensei. Procurei, mas não achei, entretanto o cheiro continuava. Olhei com mais cuidado e a encontrei debaixo de uns pés de "pingo de ouro" - e pelo seu aspecto já estava morta a vários dias. Era o fim de uma história que poderia ter sido divertida, alegre e com um final feliz, mas não foi. Abri uma cova no quintal e, respeitosamente, enterrei ali aquele animal que em sua vida só queria viver, correr, brincar e se divertir. Um simples animal que, provavelmente, foi envenenado e morto por alguém que se intitula "ser humano".
Cícero Alvernaz (autor)

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